Os desembargadores da 4a Câmara Cível, por unanimidade, negaram provimento ao recurso interposto por uma mulher, que apelou da sentença de primeiro grau que não reconheceu a união estável post mortem que buscava. A defesa alegou que as provas produzidas e apresentadas nos autos acerca da existência da união estável são robustas, visto que a testemunha apresentada pela mulher foi firme e convincente em seu depoimento, ao afirmar que conhecia as partes e presenciou a convivência do casal entre 2003 e 2015. Ponderou sobre o fato de a mulher ter declarado em processo de benefício previdenciário, em 2014, residir em outro endereço e o estado civil ser de solteira, não mencionando o então marido, e apontou que isso não tem condão de desconstituir a união estável havida entre os dois, de modo que a inexistência de coabitação não desconstitui a união estável. Requereu o provimento do recurso para que haja reconhecimento e dissolução post mortem da união estável. De acordo com o processo, a autora viveu em união estável com o falecido desde o ano de 2003, tendo a relação somente se encerrado com a morte dele, em 2016. Inicialmente, ambos viviam em um barraco de madeira improvisado, de propriedade do então companheiro, mas posteriormente mudaram-se para uma casa construída pelo casal. Após a morte do marido, os filhos do falecido teriam expulsado a autora da residência na qual residia com ele. Dessa forma, buscou o reconhecimento da união estável post mortem para ter direito sobre o imóvel. O relator do processo, Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva, destacou que o tema em questão é tratado pela Constituição Federal, no art. 226, que dispõe que a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado e, acrescentando no § 3o do dispositivo, para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. Escreveu o relator, em seu voto, que o art. 1.723 do Código Civil é ainda mais específico, estabelecendo que é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. No entanto, apontou o magistrado que a autora não instruiu a petição com nenhum documento hábil a demonstrar a existência do relacionamento estável com o falecido companheiro, uma vez que não foi apresentado nenhum registro fotográfico dos dois juntos. O magistrado destacou também que a única prova testemunhal ouvida afirmou conhecer ambos como casal apenas em 2013, não trazendo nenhum detalhe sobre a suposta relação. “Entretanto, os filhos do falecido anexaram aos autos documento, como relatório social extraído da ação previdenciária, de 2015, no qual a autora está qualificada como solteira, residente em imóvel próprio, adquirido por meio do programa de habitação municipal”, destacou o relator.
Assim, no entender do desembargador, é inviável concluir que a mulher vivia em união estável com o falecido, tendo em vista que do conjunto probatório somente uma testemunha, arrolada por ela própria, confirmou a versão dos fatos. “Se a autora e o falecido de fato tivessem convivido em união estável, seria bastante razoável que fossem vistos juntos por várias pessoas e não apenas por uma única testemunha. A fragilidade da prova apresentada acaba por enfraquecer sobremaneira as alegações autorais”, afirmou. O magistrado lembrou ainda que, por intermédio da certidão de óbito, constatou-se que o declarante do falecimento foi o filho do finado, corroborando com a ideia de que ambos não vivem como casal, pois seria bastante natural que a companheira fosse a declarante do óbito ou, ao menos, mencionada nas observações constantes em tal documento. “Por todo o exposto, é possível concluir que nenhum dos elementos caracterizadores da união estável está configurado na hipótese sub judice, já que não se verifica a existência de reconhecimento social da autora e do falecido como casal, tampouco em relacionamento contínuo e estável, com intuito de constituição de família. Posto isso, nego provimento ao recurso. É como voto”, concluiu. O processo tramitou em segredo de justiça.

Fonte: Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul