O Pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) reconheceu a inconstitucionalidade de dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), incluídos pela reforma trabalhista de 2017, que impõem ao beneficiário da justiça gratuita o pagamento das custas processuais, bem como condiciona o ajuizamento de nova ação trabalhista à satisfação da despesa. De acordo com o relator do caso, desembargador João Amilcar Silva e Souza Pavan, os dispositivos questionados não respeitam o princípio da igualdade, as garantias do acesso à justiça e da assistência jurídica integral e gratuita a quem comprovar insuficiência de recursos, assegurados pelo artigo 5º da Constituição Federal.

No julgamento de um recurso trabalhista, a Segunda Turma do TRT-10 suscitou incidente de arguição de inconstitucionalidade para que o Tribunal discutisse a higidez, ou não, de dois parágrafos do artigo 844 da CLT, incluídos pela Lei 13.467/2017: o parágrafo 2º, que impõe ao empregado, ainda que beneficiário da justiça gratuita, o pagamento das custas processuais, quando ele não comparecer à audiência designada e não justificar a ausência, e o parágrafo 3º, que condiciona a propositura de nova demanda ao pagamento das custas. Consta dos autos que no processo originário a trabalhadora não compareceu à audiência designada e seu processo foi arquivado, como determina o artigo 844 da CLT. Como consequência, ela também foi condenada ao pagamento das custas processuais, apesar de ser beneficiária da justiça gratuita.

Igualdade
Em seu voto, o relator lembrou que a cabeça do artigo 5º da Constituição Federal de 1988 diz que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Já o inciso XXXV deste mesmo artigo afirma que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito e, por fim, o inciso LXXIV assegura que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.

Nesse sentido, o desembargador revelou que no processo civil, ao litigante beneficiado pela gratuidade judiciária é assegurada a suspensão da exigibilidade de todas as despesas processuais decorrentes de sua sucumbência, pelo período máximo de cinco anos, desde que ele conserve a condição de hipossuficiente. Já nos dispositivos em análise, o trabalhador só estará livre do pagamento das custas se justificar a ausência, e estará impedido de ajuizar nova demanda enquanto não fizer o pagamento.

Não há razoabilidade mínima nessa diferenciação, ressaltou o relator. “Ao contrário, aflora sereno o estabelecimento de dois graus de exercício da cidadania, quando a circunstância do autor da ação ser empregado, postulando direitos trabalhistas, o discrimina – de forma negativa e reducionista – em comparação a todos aqueles litigantes na esfera do processo civil”. Da mesma forma, a regra cria discriminação injustificada ao impor a um trabalhador carente de recursos barreira insuperável para o seu acesso à jurisdição, quando comparado com outro em condições de suportar as despesas do processo, arrematou.

Para o relator, o ordenamento infraconstitucional acabou por tratar de forma desigual os cidadãos que buscam a reparação de seu patrimônio jurídico de forma condicionada à natureza da lesão ou da causa – cível ou trabalhista -, criando situação mais gravosa ao segmento das categorias profissionais. “Tal recurso procedimental não passa pelo crivo da virtude suprema da igualdade, assegurado pelo artigo 5º (caput) da CF”.
No intuito de realizar a garantia do acesso à jurisdição como meio capaz e adequado para a superação dos interesses em conflito inciso (XXXV), explicou o desembargador João Amilcar, o texto constitucional foi redundante, impondo de forma expressa que o Estado, em todas as suas dimensões, preste assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.

Com esses argumentos, o relator votou pela inconstitucionalidade parcial dos parágrafos 2º e 3º do artigo 844 da CLT, na parte que impõem ao beneficiário da justiça gratuita o pagamento das custas processuais, bem como condiciona o ajuizamento de nova ação trabalhista à satisfação da despesa.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região